segunda-feira, 27 de dezembro de 2021

Peneirando o sentido do Natal de Jesus Cristo. Por Frei Gilvander

Peneirando o sentido do Natal de Jesus Cristo. Por Frei Gilvander Moreira[1]


 Tempo de Natal e de virada de ano é tempo propício – kairós – para fazermos revisão de vida, retrospectiva e resgatar o que de mais humano existe em nós e na humanidade. Para isso, faz bem peneirarmos o sentido do Natal: o do mercado idolatrado e o de Jesus Cristo. Uma avalanche de mensagens natalinas chegou a nós por meio das redes virtuais, eufemisticamente chamadas de ‘redes sociais’. Mensagens para todos os gostos: muitas ingênuas e uma minoria, críticas, criativas e inspiradoras. Como desejar “feliz natal, boas festas e um próspero ano novo” diante de milhões que tiveram um infeliz natal, não puderam fazer nenhuma festa e não terão um próspero ano, porque estão adoecidos, em luto pelos mais de 620 mil mortos, não apenas pela pandemia da covid-19, mas principalmente pela política genocida que impera no nosso Brasil, porque têm seus corpos bombardeados pela bomba da fome causada pelo latifúndio, pelo agronegócio (que não produz alimentos, mas commodities para a exportação para acumulação de lucro e capital para poucas empresas transnacionais), pela epidemia de câncer e Alzheimer causada principalmente pelas centenas de agrotóxicos jogados pelos agronegociantes na agricultura empresarial, que envenenam a mãe terra, a irmã água, o ar e os alimentos; sob uma política econômica neoliberal/neocolonial que amputa diariamente o braço social do Estado e hipertrofia o braço repressor do Estado, privatizando a terra, as águas, as empresas estatais e públicas, as rodovias, ferrovias, os (aero)portos, cortando direitos trabalhistas, previdenciários e sociais toda semana e, pior, devastando o meio ambiente com desmatamento, mineração, garimpo e monoculturas, com um poder legislativo nos três níveis do Estado onde predomina o centrão e a direita e um poder judiciário que defende mais a propriedade privada capitalista do que a dignidade humana e a dignidade de toda a biodiversidade? Quem lidera ou é coadjuvante ou cúmplice desta brutal violência planejada a sangue frio para matar milhões são os Herodes de hoje e assassinam cotidianamente milhares de meninos-Deus que insistem em nascer todos os dias.

No natal trombeteado aos quatro ventos pelos arautos do mercado idolatrado, um antinatal, o “dono da festa”, que nasceu já ameaçado de morte, fica mais oculto do que o amigo oculto. Uma sociedade capitalista abusa do nascimento de Jesus Cristo para auferir lucro e acumular capital, promovendo gastança, viagens que resultam em centenas de mortes e comilanças; pior, humilham milhões de pessoas que não podem gastar, viajar e nem promover comilanças. Com roupa vermelha para induzir o consumo de um refrigerante (melhor não dizer o nome), de uma transnacional, que mais serve para desentupir pia, o papai noel é um mentiroso, nojento e fantoche do ídolo capital que cumpre uma tarefa suja: seduzir as crianças e as famílias para consumirem ao máximo até se consumirem e se desumanizarem gradativamente. É idolatria colocar esta representação do polo norte para seduzir as crianças para fomentar a cultura do “dar presentes” e encobrir a cultura do menino-Deus nascido em um cocho de curral na periferia de Belém que, como testemunham os pastores e os magos, pedem para sermos PRESENTE, PRESENÇA HUMANA, na vida das outras pessoas, não apenas de nossa família nuclear biológica, mas da família humana e ecológica mundial.

Ver e sentir o menino-Deus nas crianças recém-nascidas é mil vezes mais humano-divino do que ver o menino-Deus representado em presépios artificiais. Estranho pessoas colocarem suas próprias fotos em mensagens de natal. Não seria mais humanizador partilhar uma foto que atualizasse o menino-Deus nascendo atualmente de mil formas no meio dos empobrecidos?

Diante das mensagens natalinas ingênuas e/ou portadoras da ideologia do capitalismo, como desejar prosperidade, algo que diz respeito a crescimento econômico pessoal, sem responsabilidade social, na linha da ideologia da prosperidade, suplico a Deus, mistério de infinito amor: “Pai, perdoai-lhes, pois eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34). Porém, sobre os opressores, rezo: Pai, não perdoai-lhes, pois eles sabem que o que fazem, roubam os bens que deveriam ser comuns a todos/as. Fazem isso para curtir poder, status e prazer à custa do sangue de muita gente.

Ao peneirar as mensagens natalinas que recebi, me alegrei com várias e partilho algumas aqui abaixo no intuito de resgatarmos o verdadeiro e libertador sentido do Natal de Jesus Cristo.

Com Dom Hélder Câmara (1909-1999), reafirmamos: “Gosto de pensar no Natal como um ato de subversão... Um menino pobre, uma mãe solteira, um pai adotivo... Quem assiste seu nascimento é a ralé da sociedade, os pastores. É presenteado por gente ‘de outras religiões’, os magos. A família tem que fugir e assim viram refugiados políticos. Depois voltam a viver na periferia. O resto a gente celebra na Páscoa... mas com a mesma subversão... sim! A revolução virá dos pobres! Só deles pode vir a salvação! Feliz Natal subversivo!”

Provavelmente para não ser condenado à pena de morte como Jesus Cristo, um autor desconhecido nos diz: “Romantizamos o presépio, mas ele deveria ser a encarnação da denúncia. Nasce uma criança jurada de morte pelos poderosos. Portas fechadas nas propriedades dos abastados. Ausência de teto para uma família empobrecida. Ausência de leito para uma mulher dar à luz. O que sobra é um insalubre lugar onde ficavam os animais. O fedor do esterco, os ratos que corriam pelas madeiras do telhado. A criança que sai da segurança do útero é recebida já como sobrevivente, vulnerável. No lombo do jumento segue o caminho de tantos refugiados. Império infanticida manda sua polícia matar as crianças, tentando assim abortar a voz de uma vida dedicada à justiça. Mas há fuga. Há resistência. Há desobediência.”

Ao lado de uma fotografia de Jesus, um chargista anônimo, talvez para não assanhar perseguição sobre si mesmo, alerta: “Pô gente, acorda! Não morri só para salvar vocês, mas porque incomodei o sistema opressor”. Que beleza uma charge sobre os Magos visitando Maria com o menino no colo: Padre Júlio Lancellotti distribuindo solidariedade libertadora, um Sem Terra distribuindo alimentos saudáveis para amenizar a fome que golpeia mais de 22 milhões de brasileiros e uma enfermeira do SUS aplicando vacinas contra a covid-19, inclusive nas crianças.

Que maravilha em uma Comunidade Quilombola uma árvore de Natal feita com mandiocas, bananas e adereços simples! “Há presépios que são construídos todos os dias do ano”, onde estão Maria grávida ou com uma criança recém-nascida no colo e José, homem justo, ao lado sendo companheiro. Ou: “Todos os dias, em algum lugar do mundo, o presépio está vivo.” “É contraditório comemorar o nascimento de Jesus, uma criança refugiada, e querer imigrantes longe do seu país.” Inspirador também foi e sempre será participar de uma vigília de Natal em uma Ocupação onde mães com crianças e pais, na iminência de serem despejados, lutam aguerridamente por moradia, pão e dignidade.

Amar o/a próximo/a como Jesus amou, sem discriminar ninguém, sem exceção, nem por ser do grupo LGBTQIA+, espírita, do candomblé ou da umbanda. E jamais armar o próximo como os milicianos, eis a mensagem fundamental do subversivo Jesus de Nazaré que se humanizou a ponto de se tornar o Cristo, nosso Senhor e Salvador. Esta mensagem anima e fortalece a luta pela construção do Reino de Deus aqui e agora, no meio de nós, a partir dos preferidos de Jesus, os empobrecidos! E é com esse propósito que se pode falar de um ano verdadeiramente novo, (re)construindo a esperança que brota das lutas populares e massivas!

Belo Horizonte, MG, 27/12/2021.

 Obs.: Os filmes e vídeos nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Frei Carlos Mesters: “O sentido verdadeiro do Natal de Jesus Cristo.” – 17/12/2021

2 - O verdadeiro sentido do Natal, com os freis Carlos Mesters e Gilvander Moreira

3 - Presépio Natal de Jesus pobre: Acampamento na Porta do Palácio da Liberdade, BH/MG: Luta por Moradia

4 - Mensagem de Natal: Deus revolucionário no humano a partir dos últimos - Frei Gilvander - 24/12/2020

5 - Festa de Natal na Ocupação Esperança, Izidora, BH. Fala de Leonardo Péricles, da UP. 23/12/2019

6 - Natal passa pelo respeito ao direito à moradia/Ocupação Vila da Conquista/BH/MG/Vídeo 2 - 23/12/18

7 - Vem, Senhor, com teu povo caminhar!-Celebração do Natal-Ocupação Vila Nova-BH/MG-3a Parte-10/12/2017

8 - CEBI, CEBs, MST /MNPR: " Somos um Povo que quer Viver". Quilombo Campo Grande, MST, Campo do Meio/MG



 

 



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

terça-feira, 21 de dezembro de 2021

Natal: O divino no humano, a partir dos últimos. Por Frei Gilvander

  Natal: O divino no humano, a partir dos últimos. Por Frei Gilvander Moreira[1]


 É tempo de natal e de virada de ano. Dá para celebrar o natal de Jesus Cristo no meio da fase mais cruel do capitalismo, máquina de triturar vidas humanas e vidas de todos os seres vivos, que atualmente não apenas explora, mas superexplora a dignidade humana, a dignidade da mãe terra, da irmã água e de toda a biodiversidade? Sob a avalanche do antinatal do mercado idolatrado, necessário se faz resgatar o sentido bíblico do Natal de Jesus Cristo, que é inspirador e revolucionário. Faz bem entendermos a narrativa bíblica do Evangelho de Lucas (Lc 2,1-20) que versa sobre o nascimento de uma criança que se tornou Cristo. O Evangelho de Lucas não é crônica jornalística escrita sob o calor dos fatos. Escrito na década de 80 do século I da era cristã, o Evangelho de Lucas é Teologia da História a partir dos oprimidos e injustiçados e da sua fé na ressurreição de Jesus Cristo. Para o evangelista Lucas, foram os pastores – os trabalhadores mais discriminados da época – os que, por primeiro, reconheceram a encarnação do divino no humano.

Jesus de Nazaré nasceu em tempos de imperialismo romano, com o imperador Augusto baixando decreto para aumentar o peso da tributação nas costas do povo, além de manter a superexploração, por meio de relações sociais escravocratas que aviltavam a dignidade humana de mais de 60 milhões de pessoas nas muitas colônias do Império Romano. Diz o evangelista Lucas: “Naqueles dias, o imperador Augusto publicou um decreto ordenando recenseamento em todo o império” (Lc 2,1). Como o pai de Jesus, José, era descendente de Davi e natural de Belém, ele teve que viajar da cidadezinha de Nazaré, na Galileia – periferia e norte da Palestina -até Belém, na Judeia, mais de 120 quilômetros, a pé ou montando em jumento, com sua esposa Maria, que estava na iminência de dar à luz um menino (Lc 2,3-5). Em uma colônia dominada pelo imperialismo romano, por governadores submissos aos interesses imperiais e com a cumplicidade de um poder religioso – o sinédrio – que usava o nome de Deus para excluir e marginalizar a maioria do povo, como trecheiro, estradeiro, “irmão de rua”, migrante, retirante, sem-terra, sem-teto, refugiado, índio, quilombola, migrante e judeu da periferia, nasceu Jesus Cristo na periferia de Belém, pequena cidade do interior. Jesus não nasceu em Jerusalém nem em Roma, capital do império, nem em Brasília, nem na Avenida Paulista e nem nos Estados Unidos. Maria e José tiveram que ocupar um estacionamento de uma pensão da periferia de Belém, porque não tinham dinheiro para pagar hotel ou uma maternidade particular.

Jesus nasce no meio dos pastores (Lc 2,8), os injustiçados e execrados pela classe dominante (saduceus) onde estão os senhores “de bens”, que por cumplicidade reproduzem a desigualdade social. Entre todos os segmentos da classe trabalhadora e camponesa, os pastores e as pastoras eram os/as mais explorados/as, considerados/as impuros/as, principalmente porque não respeitavam as propriedades privatizadas. Para os pastores e pastoras, o território era um bem comum e, por isso, levavam os rebanhos que cuidavam para pastar em outras propriedades. Assim eram considerados invasores de propriedades privadas. Para os pastores e as pastoras, a terra pertencia (e pertence) a Deus e, por isso, era (e é) um bem comum, não pode ser privatizada.

Diz o Evangelho de Lucas que “um anjo de Deus apareceu aos pastores” (Lc 2,9); não apareceu ao imperador, nem ao governador, nem a nenhum sacerdote e nem a nenhuma pessoa considerada “pura”, integrada à sociedade dos “de bens”. São esses pastores e pastoras que reconhecem o nascimento do menino Deus e vêm ao encontro daquele que iria testemunhar um caminho de libertação para todos/as e tudo, a utopia “vida e liberdade para todos/as e tudo” (Jo 10,10).

Nos Evangelhos de Lucas e de Mateus, o nascimento de Jesus não é apresentado de forma neutra diante das contradições e desigualdades sociais. José, Maria, Jesus, os evangelistas e as primeiras comunidades cristãs (autoras dos Evangelhos) fazem opção de classe, têm lado: o lado dos oprimidos e injustiçados. A luz divina foi experimentada pelos pastores e pastoras, em uma noite escura (Lc 2,8-9), como a noite que se abateu sobre o povo brasileiro com a eleição de Bolsonaro e da maioria do Congresso Nacional do Centrão ou da direita opressora, todos vassalos de um capitalismo ultraliberal. A luz e a força divina irromperam naqueles e naquelas que eram os/as mais rejeitados/as na Palestina, colônia do Império Romano.

Nas primeiras comunidades cristãs se lia na época em que nasceu Jesus Cristo o texto do profeta Isaías que dizia: “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz, uma luz raiou para os que habitavam uma terra sombria” (Is 9,1). A primeira mensagem do anjo aos pastores e pastoras foi: “Não tenham medo! Eis uma ótima notícia para todo o povo explorado: hoje, na cidade de Davi, nasceu para vocês um Salvador, que é o Messias, o Senhor” (Lc 2,10-11). Essa mensagem ganha eloquência se recordarmos que quando se elevava um novo imperador ou rei, arautos do império anunciavam a entronização aclamando o que estava sendo entronizado como novo Salvador (soter, em grego) e Senhor (Kurios, em grego). O povo escravizado passou a acreditar no menor: Senhor e Salvador, agora, é o menino-Deus.

As primeiras comunidades cristãs fazem uma revolução copernicana e subvertem a ideologia dominante que divinizava o poder e quem estava no poder. ‘Salvador’ e ‘Senhor’ não será mais o imperador e nenhum rei. ‘Salvador’ e ‘Senhor’ será aquela criança que nasceu no meio dos superexplorados. O anjo alerta: só quem se mistura com os periféricos e com eles convive consegue experimentar o divino se revelando no humano a partir dos porões da humanidade (Lc 2,12). Quem fica distante dos empobrecidos e empobrecidas acumula preconceitos e se desumaniza. Diz o evangelista Lucas que os anjos fazem festa ao experimentar a glória de Deus e a paz (shalom, em hebraico) no meio do povo (Lc 2,14). A glória de Deus brilha quando o humano em todas as pessoas é respeitado e valorizado. Paz como fruto da justiça, shalom, acontece quando construímos relações humanas e sociais a partir da organização popular que conquiste mudanças estruturais que superem a desigualdade social e promove a justiça social com respeito à imensa diversidade cultural, aos direitos da natureza, dos animais e toda a biodiversidade existente no nosso país e no mundo.

Os pastores da região foram a Belém, às pressas, participar do acontecimento” (Lc 2,15-16); não foram a Jerusalém, nem a Brasília, nem às catedrais do deus mercado, nem ao Império do capital, nem ao agronegócio e nem às mineradoras. “E todos os que ouviram os pastores ficaram maravilhados” (Lc 2,18). Quem não ouve, não respeita e nem participa da luta dos/as sem-terra, dos/as sem-teto, dos atingidos pelas mineradoras, dos/as migrantes, dos/as refugiados/as, dos irmãos e irmãs em situação de rua, dos/as indígenas, dos/as quilombolas, das mulheres e dos nossos irmãos e irmãs LGBTTQIs não consegue compreender o divino se tornando humano a partir de Jesus Cristo, uma criança da periferia.

Os pastores e as pastoras reconhecem o poder popular nascido na periferia de Belém, cidade do pastor Davi que se tornou rei bom. “É de ti Belém, a menor entre todas as cidades, que virá o Salvador” (Miq 5,1), bradava a profecia inspiradora do profeta Miqueias.  Etimologicamente Belém (Betlehem, em hebraico) significa Casa do Pão. Belém é a cidade de Davi, o menor entre os irmãos, aquele que organizou os injustiçados da sociedade para lutar por um governo justo, popular e democrático. O verdadeiro “rei dos judeus” não é violento e sanguinário como Herodes, é um recém-nascido, nascido sem-terra e sem-casa e tendo que se exilar às pressas, logo após o nascimento, como refugiado, para não ser assassinado pelo poder repressor de plantão. Segundo o Evangelho de João, o nascido na “Casa do Pão” se tornou Pão da Vida para todos/as (Jo 6,35-59). Os pastores e as pastoras intuem com sabedoria que o poder democrático, participativo e popular vem da periferia, dos injustiçados, dos pequenos.

Belo Horizonte, MG, 21/12/2021. 

Obs.: Os filmes e vídeos nos links, abaixo, versam sobre o assunto tratado, acima.

1 – Frei Carlos Mesters: “O sentido verdadeiro do Natal de Jesus Cristo.” – 17/12/2021

2 - O verdadeiro sentido do Natal, com os freis Carlos Mesters e Gilvander Moreira

3 - Presépio Natal de Jesus pobre: Acampamento na Porta do Palácio da Liberdade, BH/MG: Luta por Moradia

4 - Mensagem de Natal: Deus revolucionário no humano a partir dos últimos - Frei Gilvander - 24/12/2020

5 - Festa de Natal na Ocupação Esperança, Izidora, BH. Fala de Leonardo Péricles, da UP. 23/12/2019

6 - Natal passa pelo respeito ao direito à moradia/Ocupação Vila da Conquista/BH/MG/Vídeo 2 - 23/12/18

7 - Vem, Senhor, com teu povo caminhar!-Celebração do Natal-Ocupação Vila Nova-BH/MG-3a Parte-10/12/2017


[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Ciências Bíblicas; assessor da CPT, CEBI, SAB e Ocupações Urbanas; prof. de “Movimentos Sociais Populares e Direitos Humanos” no IDH, em Belo Horizonte, MG. E-mail: gilvanderlm@gmail.com – www.gilvander.org.br – www.freigilvander.blogspot.com.br      –       www.twitter.com/gilvanderluis        –     Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Queers e Pessoas Intersex.

 



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista dos sites www.domtotal.com , www.brasildefatomg.com.br , www.revistaconsciencia.com , www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Divisão do trabalho, propriedade e escravidão. Por Frei Gilvander

Divisão do trabalho, propriedade e escravidão. Por Frei Gilvander Moreira[1]

Como acontecem as relações sociais em uma sociedade capitalista? A ideologia dominante diz que no capitalismo há liberdade. Qual? Para quem? Na realidade, no capitalismo, a tríade “divisão do trabalho, propriedade privada capitalista e escravidão” tecem relações sociais escravocratas que causam superexploração da dignidade humana e de toda a natureza. Vejamos! “A linguagem é tão antiga quanto a consciência – a linguagem é a consciência real, prática, que existe para as outras pessoas e que, portanto, também existe para mim mesmo; e a linguagem nasce, tal como a consciência, do carecimento, da necessidade de intercâmbio com outras pessoas” (MARX; ENGELS, 2007, p. 34). Iniciada na divisão do trabalho na família, a divisão do trabalho transformou o mundo da produção e o mundo das relações sociais. Com a divisão do trabalho, dividem-se as famílias na sociedade ficando opostas umas às outras, estabelecendo a distribuição desigual do trabalho e do seu produto. Assim, se cria, na família, de forma embrionária, a noção de propriedade, em que mulher e filhos passam a ser coisas/escravos do homem. A noção de propriedade diz respeito ao poder de dispor da força de trabalho alheia. Assim, divisão do trabalho, propriedade e escravidão constituem a tríade que sustenta a sociedade capitalista.

Com a divisão do trabalho, na qual todas essas contradições estão dadas e que, por sua vez, se baseia na divisão natural do trabalho na família e na separação da sociedade em diversas famílias opostas umas às outras, estão dadas ao mesmo tempo a distribuição e, mais precisamente, a distribuição desigual, tanto quantitativa quanto qualitativamente, do trabalho e de seus produtos; portanto, está dada a propriedade, que já tem seu embrião, sua primeira forma, na família, onde a mulher e os filhos são escravos do homem. A escravidão na família, ainda latente e rústica, é a primeira propriedade, que aqui, diga-se de passagem, corresponde já à definição dos economistas modernos, segundo a qual a propriedade é o poder de dispor da força de trabalho alheia” (MARX; ENGELS, 2007, p. 36).

Com a divisão do trabalho, “cada pessoa passa a ter um campo de atividade exclusivo e determinado, que lhe é imposto e ao qual não pode escapar” (MARX; ENGELS, 2007, p. 37). Ainda mais com o exército de reserva de desempregados, o/a trabalhador/a é obrigada/o a aceitar qualquer tipo de trabalho que lhe apareça, sem ter direito de optar por aquilo que gosta de fazer ou que seja sua vocação. E não pode também trabalhar em várias funções, o que cultivaria sua criatividade e seria menos cansativo. “Na sociedade comunista, onde cada um não tem um campo de atividade exclusivo, mas pode aperfeiçoar-se em todos os ramos que agradam, a sociedade regula a produção geral e me confere, assim, a possibilidade de hoje fazer isto, amanhã aquilo” (MARX; ENGELS, 2007, p. 38).

Não são as ideias que dominam o mundo e as pessoas, mas “as ideias da classe dominante, são, em cada época, as ideias dominantes, isto é, a classe que é a força material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, sua força espiritual dominante” (MARX; ENGELS, 2007, p. 47). Por ter em suas mãos os meios de produção material, a classe dominante domina também pensando, produzindo ideias que regulam a (re)produção e a distribuição das ideias de seu tempo. A divisão de trabalho acontece também no interior da classe dominante. Nesta, “uns serão os ideólogos ativos, criadores de conceitos, que fazem da atividade de formação da ilusão dessa classe sobre si mesma o seu meio principal de subsistência” (MARX; ENGELS, 2007, p. 48), enquanto outros são os membros ativos dessa classe e se ocupam com a produção de mais-valia e a acumulação do seu capital.

Para atingir seus fins, a classe dominante tem que apresentar seu interesse como o interesse comum de todos os membros da sociedade: “É obrigada a dar às suas ideias a forma da universalidade, a apresentá-las como as únicas racionais, universalmente válidas” (MARX; ENGELS, 2007, p. 48).

As relações entre diferentes nações dependem do ponto até onde cada uma delas tenha desenvolvido suas forças produtivas, a divisão do trabalho e o intercâmbio interno. Esse princípio é, em geral, reconhecido. Mas não apenas a relação de uma nação com outras, como também toda a estrutura interna dessa mesma nação dependem do nível de desenvolvimento de sua produção e de seu intercâmbio interno e externo. A que ponto as forças produtivas de uma nação estão desenvolvidas é mostrado de modo mais claro pelo grau de desenvolvimento da divisão do trabalho. Cada nova força produtiva, na medida em que não é a mera extensão quantitativa de forças produtivas já conhecidas (por exemplo, o arroteamento de terras), tem como consequência um novo desenvolvimento da divisão do trabalho. A divisão do trabalho no interior de uma nação leva, inicialmente, à separação entre o trabalho industrial e comercial, de um lado, e o trabalho agrícola, de outro, e, com isso, à separação da cidade e do campo e à oposição entre os interesses de ambos” (MARX; ENGELS, 2007, p. 89).

Na história da humanidade houve diversas concepções de propriedade da terra. A primeira forma da propriedade é a propriedade tribal[2], que pressupõe uma grande quantidade de terras incultas, baixa população e corresponde à fase não desenvolvida da produção. O povo se alimentava da pesca e da caça, pastoreando algum rebanho e/ou com algum início de agricultura, o que criou as sociedades agrárias. A escravidão se desenvolve primeiro na família com o aumento da população, com o crescimento das necessidades, com o aumento do intercâmbio comercial e com as guerras.

A segunda forma de propriedade é a propriedade estatal ou comunal da Antiguidade, que resulta da unificação de mais de uma tribo numa cidade por meio de contrato ou conquista, e na qual a escravidão continua a existir” (MARX; ENGELS, 2007, p. 90). Com o avanço do modo de produção surge a propriedade privada móvel, depois a propriedade privada imóvel e vai-se desenvolvendo. “A terceira forma de propriedade é a propriedade feudal ou estamental. Se a Antiguidade baseou-se na cidade e em seu pequeno território, a Idade Média baseou-se no campo” (MARX; ENGELS, 2007, p. 90). Com o declínio do Império Romano e sua conquista pelos chamados povos bárbaros, mas que não eram bárbaros – eram humanos tanto quanto os latinos – uma enorme quantidade de forças produtivas foram destruídas e com pestes e guerras houve uma grande diminuição das populações, o que tornou possível ser engendrado o modo de produção medieval com grandes territórios vazios. “A propriedade principal era constituída, durante a época feudal, de um lado, pela propriedade da terra e pelo trabalho servil a ela acorrentado e, do outro, pelo trabalho próprio com pequeno capital que dominava o trabalho dos oficiais” (MARX; ENGELS, 2007, p. 91). Nas cidades, “as castas ou os estamentos que formavam esses núcleos dependiam física e socialmente do campesinato. [...] Tudo e todos tornavam o camponês a base indispensável da reprodução social” (MOURA, 1988, p. 10). Enfim, o sistema capitalista se sustenta e se reproduz cotidianamente impondo a divisão do trabalho, a propriedade privada dos meios de produção e do capital financeiro e a escravidão nas relações sociais.

01/12/2021

Referências

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã: crítica da mais recente Filosofia alemã em seus representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e do socialismo alemão em seus diferentes profetas (1845-1846). São Paulo: Boitempo Editorial, 2007.

MOURA, Margarida Maria. Camponeses. 2ª edição. São Paulo: Editora Ática, 1988.

Obs.: Os vídeos nos links, abaixo, ilustram o assunto tratado acima.

1 - Rodoanel na RMBH, racismo ambiental. Fora, Rodoanel! Respeite Santa Luzia/MG. Glaucon Durães na ALMG

2 - Adv. Henrique Lazarotti mostra a atrocidade que será Rodoanel na RMBH, se for construído. Na ALMG/BH

3 - Frei Gilvander na ALMG: "Qualquer Alternativa de Rodoanel na RMBH será brutalmente devastadora."

4 - Acampamento Marielle Vive, em Valinhos, SP, sob ameaça de despejo. Basta de despejo! – 28/11/21

5 - Qualquer alternativa de traçado de RODOANEL na RMBH será devastadora (Frei Gilvander/Rádio América)

6 - Ato “Fora, Bolsonaro na Periferia”, no Aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, MG: BASTA! – 27/11/21



[1] Frei e padre da Ordem dos carmelitas; doutor em Educação pela FAE/UFMG; licenciado e bacharel em Filosofia pela UFPR; bacharel em Teologia pelo ITESP/SP; mestre em Exegese Bíblica pelo Pontifício Instituto Bíblico, em Roma, Itália; agente e assessor da CPT/MG, assessor do CEBI e Ocupações Urbanas; prof. de Teologia bíblica no SAB (Serviço de Animação Bíblica), em Belo Horizonte, MG; colunista de www.domtotal.com , de www.brasildefatomg.com.br , de www.revistaconsciencia.com , de www.racismoambiental.net.br e outros. E-mail: gilvanderlm@gmail.com  – www.gilvander.org.br  – www.freigilvander.blogspot.com.br       –       www.twitter.com/gilvanderluis         – Facebook: Gilvander Moreira III

[2] Na década de 1840, o termo Stamm, na língua alemã (tribo, clã, tronco, linhagem) desempenhava um papel fundamental na ciência da história. Designava uma comunidade de pessoas que descendia de um único e mesmo predecessor (Cf. Nota n. 17, MARX; ENGELS, 2007: 549).